Palavras do historiador italiano Giovanni Papini (1881 - 1956) em seu livro História de Cristo sobre a sempre incompreendida solidão - e, subentende-se, sobre o isolamento:
"Quem disse: 'ai do só!' mediu o próprio medo. A sociedade é um sacrifício, tanto mais meritório quanto mais repugnante. A solitude, para os de alma rica, é prêmio, não é expiação. É uma auto-vigília de bem certo, uma criação de beleza interna,um breve reconciliar-se com os ausentes. Somente na solidão é que vivemos com os nossos iguais, como aqueles que, sozinhos, encontraram os magnânimos pensamentos que nos consolam de outros bens deixados ... Jesus esteve entre os homens e voltará a eles porque os ama. Muitas vezes, porém, ele se esconderá para ficar só, longe também dos discípulos. Para amar os homens é preciso abandona-los de vez em quando".
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Terminei de ler recentemente Na natureza selvagem, de Jon Krakauer, livro sobre o jovem americano Chris McCandless e sua decisão de abandonar a família e uma promissora carreira para vagar sem rumo por estradas, rios e fazendas até chegar ao seu grande objetivo, o desafiador Alasca. Quando vi o excelente filme e principalmente quando li a obra não compreendi como este eremita poderia ter tamanha facilidade de se socializar e cativar quem se aproximasse. Outros andarilhos, empregadores, uma garota que se apaixonou por ele, gente que o acolheu ou simplesmente deu-lhe uma carona, todos falam de "Alex Supertramp" (o pseudônimo adotado por Chris) com admiração que beira a reverência.
A última foto de Chris McCandless |
É mais fácil entender a veneração dos amigos: como não se impressionar com um personagem tão rico, tão incomum e tão ousado? Além disso, o aparente despreparo do aventureiro atraiu a atenção e o cuidado de seus conhecidos, desde um senhor que deu-lhe um teto por alguns meses e chegou a propôr uma "adoção" ao caronista do destino gélido que ofereceu o pouco que tinha em sua caminhonete: um lanche, botas impermeáveis e roupas mais pesadas. Finalmente, Alex influenciou seus aliados para que tentassem algo novo ou simplesmente procurassem vissem a vida duma nova maneira.
O lado do protagonista, no entanto, só consegui compreender (parcialmente) após ler a citação que abre este post. Por mais que eu tenha meus momentos em que busque o isolamento, não o faço com o mesmo intuito que Alex devia faze-lo: para melhor ver o homem, o valor seu e de seus gestos - ao mesmo tempo em que evitava criar amarras e até saturar-se com os inevitáveis atritos que pudessem surgir desses contatos. Acho que o solitário comum - grupo do qual faço parte - toma apenas estas medidas preventivas enquanto "os de alma rica" citados têm esta visão contemplativa de McCandless.
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Coincidentemente, comecei a reler Robinson Crusoe. Escolhi ler a obra de Defoe por já te-la lido a muitos anos e por ter comprado uma cópia a pouco tempo num sebo daqui de Campinas. Confesso que nem havia percebido a semelhança das duas narrativas - apesar de que o primeiro caso de isolamento foi opcional e o segundo, acidental. A citação ali do alto, aliás, é do prefácio - abertura que trata da obra ao mesmo tempo em que pincela ideias interessantes sobre a solidão. Agora vou rever o exílio fictício de Robinson, procurar semelhanças e influências em Alex e, caso me anime muito, escreverei um paralelo entre os dois personagens.
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