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Wednesday, June 5, 2013

Retorno aos gramados

Em setembro do ano passado escrevi sobre meu abandono esportivo. Desiludido com o espiral descendente que cerca o futebol, resolvi me desligar completamente do esporte e até cancelei minha carteirinha do Torcedor Camisa 10 (ou apenas "TC10"), o programa de sócio-torcedor da Ponte Preta. Alguns dos motivos foram: administrações pretensamente profissionais, a tentativa de elitizar o público dos estádios, jogadores cada vez mais limitados sendo alçados cada vez a maiores alturas, o show de horrores e gastos dos preparativos da Copa, a meiga demência da nova geração de jornalistas esportivos circenses... enfim, vou parar com a listagem antes de desistir novamente.

A aberração
Fiquei alguns meses afastado, mas não resisti e voltei ao Moisés Lucarelli na partida contra o Palmeiras na primeira fase do Paulista. Meu time perdeu e encerrou uma longa série invicta, mas isto não vem ao caso (antes que me acusem de ser pé frio). Apesar de todos os fatores citados acima, sentia falta da convivência com amigos de estádio e com a atmosfera única do local. Reencontrei muitos amigos, revi o time, mas a primeira mudança significativa foi a setorização do estádio. O setor Brahma foi criado na lateral do campo para beneficar o Torcedor Camisa 10 e, com suas cadeiras vermelhas e brancas, espremeu o torcedor ponte-pretano na arquibancada localizada atrás do gol. O novo setor ainda é rejeitado por torcedores comuns e até por integrantes do TC10 pois a cultura da arquibancada é muito enraizada no torcedor. Além disso, há o ingrediente da construção do estádio pela própria torcida, mais um motivo para esta profanação ser tão execrada.

Após o balde de água fria inicial, sentei-me atrás do gol. Aí sim senti o resultado mais marcante deste hiato: ficar meio ano sem pisar no estádio me deixou mais racional e, claro, torcer passa longe de ser um ato calcado na razão. Pais de família esgoelavam-se por uma cobrança de lateral dada ao adversário, jovens urravam xingamentos contra um juiz localizado a mais de trinta metros de distância e senhores já ensaiavam seus infartos a cada gol perdido.

Estas duas horas de razão em meio a um manicômio a céu aberto foram um empecilho maior do que minha intenção de voltar a torcer apaixonadamente. Este nervosismo por bobagens, as brigas estúpidas contra torcedores adversários, policiais e até outros "macacos", são pequenos orgulhos que já não fazem sentido para mim. "Ah, seu time ganhou tal título, mas você não vai ao estádio!". Grande coisa, eu digo. Há algumas formas de se frequentar o estádio e ainda assim ser um estorvo para o time: invasão de campo, arremesso de objetos, cornetagem... Aquele torcedor que entra embriagado a ponto de nem assistir a partida ama mais seu clube do que alguém que mora longe, paga pay per view e compra produtos oficiais? O ato de alguém ir ao estádio significa apenas uma certa combinação de circunstâncias favoráveis e prioridade. Mas prioridade do clube sobre outras áreas da vida do torcedor? Ou prioridade da torcida organizada, dos amigos, do ambiente, das periguetes, da bebedeira, das brigas? Que a Ponte seja tratada como fim e não apenas como meio.

Stress duma semana de trabalho condensado em um jogo (foto do site oficial)
Já divaguei até mais do que gostaria, mas o mais importante é que voltei. Refiz minha carteirinha de TC10, estive no estádio na conquista do Troféu do Interior e sempre que possível estarei na arquibancada. E quando digo "sempre que possível", significa que a Ponte já não tem a antiga prioridade de passar por cima de horas extras, eventos sociais e tardes com a família. Agora trabalho das 13 às 22 horas (perdi o jogo contra o Atlético Paranaense desta quarta-feira) e nos fins de semana não devo mais perder encontros com amigos para me esgoelar inutilmente devido a um erro dum bandeirinha. Chega de gastar minha saúde com pouca coisa, tenho outras preocupações mais relevantes e mais urgentes para receber minha atenção e os fios de cabelo que me restam.

2 comments:

  1. hahahaha, ''fios de cabelos que me restam!'' Gabi.

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  2. Só li agora porque, confesso, tive um certo receio de ler e me dar vontade de torcer novamente. Por sorte (?) não foi o que aconteceu. Meu abandono provou que é fundamentado em algo que ocorre com os mais velhos, ou melhor, os que racionalmente envelhecem.

    Por anos eu fui ao estádio, por anos eu me esgoelei, como tu mesmo aponta no texto, por nada. Nada mesmo, eu só me ferrava. E não era só no estádio, era em tudo. Grupos sobre futebol, programas de TV, jornais, conversas com a família. Tudo acabava me levando pro stress inevitável de se torcer por um clube.

    Como eu disse no meu texto, rompi. E foi como se tivesse rompido com uma namorada ou uma noiva. O dia seguinte foi aquele baque, aquele sentimento de que "não está mais lá" ainda que esteja lá de fato não está mais lá pra mim (por isso que eu acho a analogia com a ex tão boa). É como se eu não pudesse mais convidar pra sair, ver filme ou bater-papo.

    Mas sigo firme.

    Sobre o que tu escreveu, eu me sinto assim faz tempo, não consigo mais entender o desespero dos outros pelo time. É estranho demais pra mim.

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