Há, no futebol brasileiro, a presença já costumeira das torcidas organizadas nas arquibancadas durante partidas. Com sua padronização de roupas da própria instituição, seus cantos em ritmo de samba e funk e a exibição de bandeiras - com ou sem mastro dependendo da vontade do Ministério Público de cada estado - elas são tradicionais e fazem parte da experiência de frequentar estádios, algo tão necessário e inerente ao jogo quanto a trilha sonora dum filme, por exemplo. Há outros formatos e formas de torcer em outros países: barras bravas na América que fala espanhol, hooligans na Inglaterra, ultras na Itália e no restante da Europa continental.
Alguns grupos, mais precisamente neste nosso pedaço de continente, cresceram como metástase nos corredores dos clubes. Por vezes como capangas de dirigentes, em outros momentos os próprios agentes de manipulação na política dos clubes, os torcedores organizados desviaram-se de seu papel inicial de apoio durante os noventa minutos de jogo para também se envolverem com administração, contratações, dispensas... Como um "estado dentro do Estado", assumem um papel independente dentro da agremiação e não necessariamente trabalham em acordo com o objetivo da entidade.
Esse desacordo nasce devido a interesses particulares ou da torcida sobrepostos aos do clube. Torcedores bancados por dirigentes ou que pedem auxílio de jogadores para bancar uma bandeira, uma faixa, uma viagem ou simplesmente "cinquenta real pra ajudar" são algo corriqueiro nas portas de centros de treinamentos e estádios enquanto mais discretamente arquitetam-se boicotes e ataques a jogadores, assim como vaias a treinadores e dirigentes encomendados por grupos de oposição.
De tempos em tempos, no entanto, parecem surgir novas torcidas para arejar estas arquibancadas empoeiradas. Surgiram barras no Sul, no Nordeste e até em São Paulo, grupos auto-intitulados como "ultras" e renova-se o público devido à passagem dos anos e assim espera-se que, coerentemente, alguns hábitos também mudem: que acabe o culto à própria imagem, que torcedores se virem sozinhos e não mamem nas tetas de clubes e seus dirigentes e, principalmente, que contentem-se em torcer e não em tentar fazer o papel dum regime ilegítimo de algum país esquecido nos confins da África.
A melhor prova para testar tudo isto, claro, é o tempo. No princípio estas reservas de moral formadas de rapazes ávidos por fazer parte de alguma coisa - qualquer coisa - fazem juras de "tudo pelo time, nada do time" e realmente dão a impressão de que conseguiram trazer novas ideias, mentalidades e posturas em relação ao time para o qual torcem. Porém há sempre um líder apto a conduzir esse rebanho à direção que mais lhe convém, isso quando o nascimento duma nova torcida não é um empreendimento já calculado (algo como a criação do PSD por Kassab). E assim, em questão de anos ou até meses, estas novas torcidas, ultras e barras caem na vala comum de fazerem músicas sobre si mesmas, de usarem roupas com seus nomes e não camisas do time e de nutrirem-se através do parasitismo. Mais uma vez, então, troca-se o fino verniz que reveste o torcedor, mas não sua essência - e assim aguardo algo que traga mudança honesta aos estádios brasileiros pois vejo novos festejos e ouço novas músicas, mas não noto mais do que isso.
"Tem que meter os panos da torcida!!" |
* Post baseado em achismos, em lugares-comuns e no imaginário coletivo que presume tudo que acontece nos corredores dos clubes
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