Mais um ano acaba e novamente decidi listar cinco dos filmes
dos quais mais gostei neste período. Minha meta era de 50 no ano, mas pude
supera-la bem e cheguei a 84, mesmo com o tempo investido em estudos e trabalho
nestes últimos meses. Houve um pouco de tudo, como animações (Divertida Mente
não entre na lista, mas vale a recomendação), drama, ação, romance e até
musicais, além de uma ou outra série – aqui cabe uma salva de palmas a The
Sopranos, que só vi agora e que valeu cada cena de cada episódio.
Algo que me ajudou um pouco foi o uso de algumas listinhas
temáticas que mantenho numa planilha de Excel. São listas curtas, de até dez
filmes cada e dividas por temas: listas por ator ou atriz, direção, algum tema
em comum, indicados ao Oscar, entre outros. Aliás, sobre temas em comum, comecei
a seguir uma página de cinema no Facebook, a Taste of Cinema, que divulga sempre
listas. Às vezes algumas delas são esdrúxulas ou cujos critérios não são muito respeitados, mas
dali já colhi boas recomendações.
Ok, acho que já enrolei o suficiente, então vamos aos meus
filmes favoritos do ano.
Um Violinista no
Telhado (Fiddler on the Roof, 1971)
Pois é: há um musical na lista. A história, apresentada
muitas e muitas vezes na Broadway antes de virar filme, começa com uma
apresentação de Anatevka, um vilarejo de judeus localizado nas regiões rurais
da Rússia, nos primeiros anos do século XX. A apresentação é feita por Tevye
(interpretado pelo cantor Topol), patriarca que explica como a vila judia
respeita tradições antigas e cada integrante seu tem um papel bem definido como pais, as mães, filhos, rabino, casamenteira.
Tevye acrescenta que o povo judeu conseguiu manter relativas
coesão e unidade através de tantos séculos - e apesar da diáspora - porque há
esse apego às tradições, embora vivamos num mundo onde a mudança é o único
evento de ocorrência constante e garantida. E daí ele cria a analogia que dá
nome ao filme, pois manter vivos seus costumes através dum turbilhão de
mudanças seria como “tentar arriscar uma canção simples e bela sem quebrar o
pescoço”.
Logo após esta apresentação, no entanto, o tradicionalismo de
Tevye já é posto a prova quando a mais velha de suas cinco filhas, Tzeitel
(Rosalind Harris), tem seu casamento arranjado com o já maduro (quando digo “maduro”, me refiro a um homem já de barbas brancas) açougueiro da vila, Lazar Wolf (Paul
Mann) e a moça recusa o acordo feito pelo pai porque ela prefere se casar com o
jovem, mas pobre alfaiate Mótel (Leonard Frey). Adicionalmente, as duas outras
filhas em idade de casar também escolhem seus companheiros sem a intermediação
da casamenteira, uma delas inclusive se apaixonando por um rapaz russo - e não-judeu. Fora de
casa, Tevye também convive com um rapaz socialista revolucionário e com o
crescente antissemitismo vindo das comunidades russas vizinhas. E ainda assim,
no decorrer do filme, ele busca assimilar as mudanças enquanto se prende às
suas tradições, embalado pela excelente trilha sonora adaptada por John
Williams.
Paris, Texas (1984)
Travis Henderson (Harry Dean Stanton) começa o filme vagando
por um deserto no sul texano, local onde passou os últimos quatro anos de sua
vida. Dali sai e é atendido por um médico, que localiza o irmão de Travis para
que eles se reencontrem. Walt Henderson (Dean Stockwell) encontra-se com Travis
e tenta leva-lo de volta a Los Angeles de avião, mas o andarilho não aceita
viajar desta maneira e obriga a volta a ser feita de carro, atravessando alguns estados com Travis ainda em choque e incapaz de falar qualquer coisa por boa parte do caminho.
O tema central do filme são reencontros. De Travis consigo
mesmo, com a sociedade, com seu irmão, com a família de seu irmão, com seu
filho, agora adotado por Walt; e finalmente com sua mulher Jane (Natassja
Kinski). É um filme um pouco difícil de descrever sem entregar a história, que
começa a se desenrolar devagar e revela seus ingredientes de forma que envolve
e prende o espectador. Em vez de uma foto, compartilho uma cena em que
Travis passa por um homem que prega do alto duma ponte. O vídeo não tem
legendas e o que é dito nem é lá tão relevante, o que importa mais é a forma
como o protagonista se encontra com outro pária e sente alguma empatia por ele,
como é visto pelo tapinha nas costas dado quando se “despedem”.
Ran (1985)
Já não lembro exatamente quando foi, se já em 2015 ou ainda
em 2014, mas vi este vídeo
feito por um estudante de cinema a respeito do trabalho do diretor japonês Akira
Kurosawa. Ele trata principalmente sobre a forma como o diretor usa elementos
secundários, como a chuva e figurantes, para dar movimento às suas cenas.
Depois de ver o vídeo busquei alguns trabalhos dele: Rashomon, Yojimbo - O
Guarda-costas, O Idiota e o último filme que vi dele, Ran (“Caos”, em
português). O filme, criticado no Japão por tratar a narrativa de maneira mais
ocidentalizada, é uma produção épica franco-japonesa inspirada em Rei Lear, de
Shakespeare.
A história conta sobre a família de Hidetora (Tatsuya
Nakadai), um senhor da guerra já consumido pela velhice. Ele decide, após uma
caçada, dividir seus territórios entre os três filhos: Taro Ichimonji (Akira
Terao), o primogênito e novo cabeça da família; Jiro Ichimonji (Jinpachi Nezu)
e o caçula Saburo Ichimonji (Daisuke Ryu). O filho mais novo tenta alertar a
seu pai que a medida é precipitada, mas o pai insiste em mante-la. Saburo avisa que algo
pode influenciar os irmãos e que sua união pode ser desfeita, mas o pai não o
leva em consideração. Pior: Saburo é deserdado e expulso dos territórios da
família.
Depois de contar como o filho excluído foi aceito por outra
família da qual faria parte graças a um casamento arranjado, Kurosawa retorna aos
dois irmãos e a Hidetora. Como previsto, surgem conflitos entre o patriarca e
seu filho mais velho Taro devido às disputas entre os dois sobre quem
efetivamente comandava o palácio e as terras da família. Jiro também é
procurado por seu pai, mas não o acolhe por se sentir desfavorecido pela
escolha de seu irmão para assumir o papel de novo líder. Humilhado e
enlouquecido, o velho começa a vagar pelos campos enquanto seus dois filhos
mais velhos entram em guerra e um dos conselheiros que manteve fidelidade a
Hidetora busca Saburo para uma possível reconciliação.
Ainda que visualmente seja deslumbrante, esta é uma obra
brutal, violenta e crua em sua narrativa. Kurosawa narra uma disputa irrefreada
pelo poder, sem espaço para piedade ou sequer gentilezas entre seus partícipes
– ao contrário de um filme sobre a máfia italiana, por exemplo, onde se mantêm
aquelas relações amistosas e dúbias com inimigos mortais.
O Homem que Mudou o Jogo (Moneyball, 2011)
Relutei por algum tempo para assistir esse filme por uma
razão muito razoável: não consigo gostar de baseball e o acho um dos esportes
mais insossos a ocupar as grades de programação dos canais esportivos. Pior:
cada temporada é imensa e por meses a ESPN transmite aquelas horas de marmanjos
mascando fumo, coçando o saco e fazendo pose para lançar a bola, que não deve
ser atingida pelo batedor. Mas enfim, o post é para falar bem deste filme
baseado em fatos reais e não mal do esporte.
Moneyball começa no fim da temporada de 2001, quando os
Oakland A’s são eliminados da liga nacional. Billy Beane (Brad Pitt), gerente
geral do time, perde seus principais jogadores e ainda tem a difícil missão de
reformular o time com um orçamento bastante apertado. Seus conselheiros também
não lhe ajudam, indicando contratações baseadas em critérios pouco ortodoxos:
um atleta é rejeitado porque sua esposa é feia e isso seria um indício de baixa
auto-estima, em um dos casos.
Billy sai então em busca de empréstimos de jogadores em
outros times e na sede de um deles, o Cleveland Indians, encontra Peter Brand
(Jonah Hill). Peter, um rapaz tímido e aparentemente não tão importante dentro
do time do qual é funcionário, revela-se uma autoridade na reunião entre Billy
e os dirigentes do Indians quando aponta quais atletas podem ou não ser
emprestados. Na saída da reunião Billy procura Peter, pergunta qual é sua
formação e quais critérios usa para tomar suas decisões quanto ao elenco. Peter
explica que é formado em Economia e se baseia em extensas análises de
estatísticas de vários atletas. Dias depois ele é convidado a trabalhar no time
californiano e lá começa a implementar sua forma de trabalho. Há alguns
obstáculos, questionamentos e derrotas no começo da disputa da liga, mas o time
passa por ajustes e alcança uma sequência de vitórias que inspirou outras
associações e reformulou a maneira como o baseball era administrado nos Estados
Unidos.
A Vida Secreta de Walter Mitty (The Secret Life
of Walter Mitty, 2013)
Este foi um dos últimos filmes que vi no ano, no domingo
logo após o Natal. Ironicamente, eu o baixei faz tempo e porque ele estava numa
lista de filmes do ator Sean Penn, que aparece numa participação discreta, de menos
de cinco minutos. Ele interpreta o xará Sean O’Connell, um premiado fotógrafo
da revista Life. Seu papel na história é enviar negativos de fotos para que o
protagonista, o daydreamer Walter
Mitty (Ben Stiller) os revele e as imagens sejam usadas na revista.
O filme começa com o envio dum rolo de negativos em que a
foto de número 25, destacada por Sean como uma foto que pode ser a capa da
próxima edição, não está no material recebido. Walter não consegue
encontra-la, assim como não encontra o fotógrafo, que percorre o mundo
desarmado de celular e redes sociais. Além da foto não encontrada, Mitty também
precisa lidar com o risco de demissão causado pela mudança de formato da
publicação, que passaria do meio impresso ao online e causaria uma redução drástica no número de funcionários.
Walter começa então sua busca pelo negativo com algumas informações colhidas em outras fotos do negativo e com algum apoio de Cheryl
(Kristen Wiig), sua colega de Life Magazine e flerte. A busca cresce, sai dos
três andares da empresa e cruza continentes para que o polêmico negativo 25
seja encontrado. De certa forma Walter Mitty me lembrou de Forrest Gump: são
dois homens absolutamente comuns levados a protagonizar epopeias ainda que
tivessem perfis improváveis para serem protagonistas de grandes aventuras.
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