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Sunday, April 1, 2012

Conselhos

Em um episódio da extinta série de comédia americana Married With Children (exibida na Bandeirantes com o título "Um amor de famíla"), o ardilo pai Al Bundy aproveita-se de sua aparência horrorosa e inscreve-se numa disputa esportiva da terceira idade mesmo ainda mal tenha chegado aos cinquenta. Ele vence a prova de corrida e, enquanto comemora no pódio, deixa uma lição - algo semelhanto aos episódios de He-Man: "Só é trapaça se você é pego".

Pois bem, essa frase me marcou profundamente em minha adolescência mesmo sem eu entender toda a profundidade dela. Achei, ainda com a vista vendada pela inocência, um absurdo um programa de tanta audiência fazer apologia à desonestidade. Porém cresci, conheci o mundo real e eu mesmo tive que adotar o ensinamento de Al em uma ou outra circunstância providencial. Só assim compreendi o que ele disse e que aquele não era um pensamento tão maligno, apenas uma confissão e um pedido de cumplicidade dum homem egoísta e utilitarista. Algo que poderia ser dito também por outros personagens fictícios como Shane, de The Walking Dead ou pelo soldado "Animal Mother" em Nascido Para Matar.
Mulheres que se encaixam no rígido padrão de beleza ocidental recriminam os trajes vestidos pelas mulheres mulçumanas (às vezes, utilizados por opção pessoal)
Após anos de reverberação, lembrei dessa frase após flagrar alguns casos gritantes de contradições ao meu redor. O "cidadão de bem" que segue toda a cartilha de comportamento caricato de classe média e que vibrou com a ação da PM contra os estudantes do FFLCH ainda fuma maconha esporadicamente apesar dos seus cada vez mais comuns cabelos brancos. A moça que concorda com o desabafo feminista de uma ex-BBB que afirma estar em seu direito quando beija quantos caras quiser chama de "vagabunda" para baixo alguma colega de trabalho que tente colocar esse comportamento em prática. O paladino da igualdade combate a homofobia fervorosamente - exceto quando discute com algum "viadinho" ou alguma "sapatona". Os exemplos são infindáveis, mas peguei apenas três bem próximos que foram os mais enfáticos que estavam à mão.

Fica aqui então minha versão do conselho de Bundy: só é hipocrisia se você deixa os pontos de assimetria mais óbvios à mostra. Cada rede social que surge é uma nova voz que pode ser adquirida pelo usuário com a postura formal e engajada do Facebook, a irreverência de turma do fundão do Twitter, o jeitinho meigo do Pinterest, a chinelagem pornográfica com trilha de heavy metal do Tumblr e tantas outras menores; somando-se essas vozes todas, caso sejam muito discrepantes, não se forma um coral. Cada um desses sites permite que os seus membros exponham alguma faceta de suas personalidades e, quanto mais facetas são expostas, mais fácil fica captar essas incoerências. Ah, quase esqueço da vida real, mas nesse convívio somos mais propensos ao comedimento, por isso é mais difícil exibirmos todas estas parcelas da personalidade que citei acima - pelo menos não expomos todos perante um mesmo círculo social. E, claro, não me julgo coerente em toda as minhas ações e opiniões, apenas tento disfarçar as incongruências.

1 comment:

  1. Achaste a definição perfeita pro twitter. Aquilo lá é a "turma do fundão" da internet (a maioria lá é ácido, mal intencionado e bagaceiro).

    Perfeito cara. Perfeito.

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