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Sunday, October 20, 2013

Boys don't cry

Houve uma época quando Collor era presidente do Brasil, campeonatos de futebol e desenhos animados japoneses não tinham protagonistas de aspectos semelhantes, todo mundo tinha um boné do Charlotte Hornets e a Aids parecia o flagelo divino definitivo. Essa época foi o começo dos anos 90 e naqueles tempos eu ainda vivia a infância, desavisado de tudo que viria depois desta fase de meu crescimento. Apesar da violência urbana crescente, ainda fui duma geração habituada a brincar muito na rua: jogava futebol, subia em árvores, soltava pipa e andava de bicicleta.

Às vezes também aprontava e arrumava briga, trocava caneladas com os coleguinhas do futebol ou até era expulso de classe no colégio, mas desde aqueles dias não entendia as crises de histeria de algumas crianças em shoppings e restaurantes. Não sei se pediam para os pais comprar algo que lhes era negado ou eram obrigados a consumir algo que não desejavam, mas eu via aquelas crianças com a cara avermelhada coberta de lágrimas e achava aquilo tudo meio... patético. Patético e ineficiente, porque geralmente a choradeira era recompensada com uma bronca e talvez até umas palmadas.

Ok, agora um brusco fast-forward para o futuro. Nesse intervalo de vinte anos aconteceu muita coisa e mudei muito, mas mantenho a dificuldade de lidar com histeria. As crianças ainda dão chilique em shoppings e restaurantes, mas parece que não são repreendidas com a mesma agressividade de outrora. Se elas têm mais sucesso do que as crianças da minha época eu não sei, mas pelo menos os esporros e palmadas elas já não levam mais. Sinal de que os pais mudaram e talvez tenham se tornados mais compreensivos com os filhos. Compreensivos ou até semelhantes.

Nesta semana a Sony abriu o sexto selo do Apocalipse quando anunciou o preço da venda do Playstation 4 e, claro, o videogame brasileiro será o mais caro do mundo custando ridículos R$ 4.000,00. Não é nenhuma novidade que tudo chega muito caro aqui, assim como foi com o antecessor PS3 e ainda é com celulares, carros, calçados e tudo mais. E o que aconteceu? Marmanjos transformaram locais de trabalho, universidades e redes sociais em corredores de shoppings porque a empresa japonesa determinou um preço "injusto" para seu produto. Houve homens protagonizando cenas mais adequadas à idade de seus próprios filhos, com direito a beicinho, xingamentos, muita birra e choradeira - torço muito para que o chororô não tenha sido literal. E enquanto o preço do console não baixa, debatem-se alternativas como importação e até uma petição para que o preço seja vendido por um preço justo. Ah, um spoiler: essa petição não vai adiantar.

Este episódio do PS4 diz algo sobre a carga tributária brasileira e a suposta ganância da Sony (não entendo que tantas empresas de tantos ramos distintos resolvam ser gananciosas justamente no mesmo país, mas enfim...), porém diz mais ainda sobre uma parcela do público consumidor de videogames. A tropa de crianças barbadas formada pelos que se recusam a sair da proteção da asa da mãe, dos jovens que covardemente compartilham imagens de namoradas nuas e dos autoproclamados "adultecentes" - palavra usada sem um pingo de constrangimento - recebe o reforço de gente que trabalha, dirige, paga contas, vota, faz filhos e bate o pé no chão para exigir seu brinquedo AGORA. Amigos que talvez tenham se identificado por terem dado chilique, entendam que não é uma questão de "cagação de regra" nem arrogância, é apenas vergonha alheia. Cresçam, sejam homens e ajam de acordo com a dignidade que vossas idades recomendam.

Zé Augusto, 32, descobre que só terá seu PS4 depois da Copa

4 comments:

  1. Hahahaha ... muito bom. É do mesmo teor do meu comentário sobre as fotos do dias da crianças, basicamente um grande PORQUE ISSO?

    Mas, corrigindo a sua ironia, tem sim o fator "ganância" da Sony no preço (para comparação o Xbox One vai ser vendido por metade do preço, ainda absurdos R$2199) que é característica do Brasil apenas. Mas, porque justamente aqui as empresas fazem isso? Simples, porque aqui temos a classe média burra que paga esse preço e torna o produto um símbolo de status. Vide, o iPhone, telefone mais vendido do mundo, na mãe de todo o tipo de pessoa nos EUA e que no Brasil é artigo de luxo (porque custa ~R$3000 e tem quem pague). O mesmo vale para todo o tipo de bem, desde sapatos até carros. Tem quem pague esse preço (e são muitas pessoas) então porque a empresa vai baixar a margem de lucro desse mercado que é uma mina de ouro?

    Ou pense assim: se eu tenho um produto que custa X e eu vendo num mercado por 4X, e mesmo assim ele vende (sendo caro) porque eu vou vender por 3X, ou mesmo 2X, se tem quem pague (e cubra meus custos todos e ainda me dê um ótimo lucro) esse preço de 4x?

    É bem simples entender porque custa tanto (é um combo de impostos + consumidor burro).

    Tenho certeza que quando toda a massa de pessoas com dinheiro tiver comprado (e as vendas começarem a cair) o PS4 vai ter seu preço reduzido para atingir que não tinha dinheiro na época (e, mesmo assim [spoiller], ainda vai ser o mais caro mundo) e todo mundo vai ficar mais feliz, e logo em seguida vai ter outro corte, e depois mais outro ... etc.

    Vai ser bom pra todo mundo (o PS3 veio pro Brasil por um preço parecido com esse e vendeu bastante).

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  2. [...]Agora, em 2013, na eminência do lançamento do Playstation 4, a Sony demonstrou[...]

    Hahuaheuhaeuhauehauehaueh

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  3. Perfeito Luiz Henrique Bomfim Fabiano. hahaha

    Quando eu digo pra tu mandar no meu e-mail todas as suas publicações, é porque eu sei que sempre tem algo bom, isto é colírio para meus olhos, puta que pariu!
    E quando eu digo pra tu ser escritor, eu também não estou brincando. Sério. Parece que tenho orgasmos múltiplos lendo essas postagens. Mas em relação ao futuro dos PAIS.. pode deixar que desde já, estou guardando borracha de fusca, varas e cipó pra dar uma surra básica nos meus futuros bacurizinhos. hahahahahahahhahaha

    ''mas pelo menos os esporros e palmadas elas já não levam mais. Sinal de que os pais mudaram e talvez tenham se tornados mais compreensivos com os filhos. Compreensivos ou até semelhantes.'' BAHH LU, PODE DEIXAR QUE EU VOU SER BEM DIFERENTE COM OS MEUS FILHOS, IRAO LEVAR UMAS PALMADINHAS SIM uahauhauhuahauhuha :P

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  4. Luiz, sensacional.

    Primeiro pelo boné do Charlotte Hornets. Eu tinha um. Eu tinha um dos Cavaleiros do Zodíaco também, do Seya. Época boa em que usar boné era ridículo porém compreensível.

    Saiu uma reportagem esses dias falando que a Suécia está passando por uma espécie de epidemia de crianças mimadas, possivelmente em decorrência da lei de proibição às palmadas educativas instituída no final da década de 70.

    http://exame.abril.com.br/mundo/noticias/suecia-tem-dificuldades-em-lidar-com-criancas-mimadas

    Vale a pena ler e refletir pra onde estamos indo.

    Eu não creio que os pais estejam compreensivos com as crianças. Eu acho que é mais preguiça e medo de educar, visto que passam a maior parte do tempo fora de casa e sentem culpa por repreender os filhos no pouco tempo que passam juntos.

    A discussão é longa.

    Agora sobre o chororô de trintões, isso é vergonha alheia master. Concordo que o preço de TUDO é abusivo aqui no Brasil por conta desse lance de status. Mas daí é só não comprar a merda do videogame. Ninguém morre por não ter um PS4. Ou então compra e não reclama.

    Ainda vou escrever um post mais elaborado sobre isso. Sai da casa do papai e da mamãe, galera. Bora crescer. É legal.

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