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Monday, February 20, 2012

Coisas, tralhas e relíquias

Outro dia procurei por um documento e tive que revirar gavetas e armários até encontra-lo. No processo reencontrei de tudo: fotos antigas, roupas que separei para doação e que ainda estão numa sacola, discos que nem lembrava ter... mais do que apenas objetos, também havia o significado por trás deles, especialmente nos casos referentes a empreitadas que iniciei e não desenvolvi. A guitarra, parte da "decoração", mostrou que os bluesmen americanos são iluminados e que só eles conseguem tocar qualquer coisa sem conhecer teoria musical - isso para o blues, imagine então para o Thrash Metal. O quimono azul dos dois meses de jiu-jitsu, aposentado quando eu estava tão fora de forma que por vezes não passava do aquecimento. O Vade Mecum do semestre (sim, no singular) de Direito cursado quando me precipitei e planejei um futuro como delegado da Polícia Civil paulista - semestre interrompido após uma epifania em que, no meio duma aula, olhei em volta e pensei "o que eu estou fazendo aqui??".

Só hoje, no entanto, percebi que ainda utilizo um objeto que poderia facilmente ter acabado entre ítens acima na galeria de desistências. Entre 2005 e 2007, ainda rechonchudo e sempre flertando com a linha dos três dígitos de peso, passei por três ou quatro academias, uma inclusive no local em que trabalho, mas nunca tive muita paciência ou disciplina - isso também explica os fracassos anteriores, exceto pela faculdade. Hoje sei que nenhuma academia pode render resultados e perda de peso a quem almoça como um operário da construção civil e depois passa a tarde em frente a um computador, mas isso não vem ao caso.

Entre estas tentativas de perder peso, passei pelas academias e tentei correr na rua, mas nunca com tanto empenho. Porém, minha precipitação que surge em toda nova "aventura" causou pelo menos um acerto: a compra dum par de tênis da Asics com correção de pisada. O modelo TN813, de aparência tão simples, tem um sistema de amortecimento mínimo, não é dos mais belos que a empresa produziu e sua parte superior cheia de furos permite melhor circulação de ar, porém transforma cada pé numa caixa-d'água com qualquer chuva. Apesar disso tudo, esse par de calçados já rodou algumas centenas de quilômetros: andamos pelas ruas de Porto Alegre duas vezes, Curitiba três vezes, nem sei quantas viagens a São Paulo, Belo Horizonte, Buenos Aires e grandes trechos de Campinas. Conhecemos estádios, museus, festas, outras tantas cidades que explorei pouco, bares, shows, parques e principalmente ruas e esteiras. 

Eu gostava de caminhar, mas tinha dores nas pernas ao percorrer grandes distâncias, cria eu que devido ao excesso de peso. Um dia, no entanto, fui a uma loja de calçados e um vendedor recomendou esse modelo, que teria a correção para pisada pronada (a de quem pisa "para dentro" e que, fui descobrir depois, sobrecarrega os joelhos). Como meus tênis antigos sofriam desgaste interno que indicava esta alteração, achei que não custaria nada tentar. Pois bem, fiz a compra e eventualmente notei que as dores dos joelhos diminuíam. Conseguia caminhar com muito mais facilidade e, depois de algum tempo e a perda de algum peso, conseguia correr como nunca achei que poderia: trinta, quarenta, cinquenta minutos. E assim, deixando inúmeras patadas pelo chão, me livrei de vinte e poucos quilos no decorrer de um ano e meio.

Atualmente não corro mais, apenas faço algumas caminhadas, mas pretendo voltar à academia em março e também às corridas, mesmo que em esteira. Confesso que pensei em me desfazer dos tênis, já que eles estão desgastados e até meio feios, mas aí lembrei dum outro modelo muito mais novo que tenho de outra marca, usado apenas para "serviços leves" e que já começa a descosturar e perder sua sola. Além da superioridade desse modelo antigo que mal chegou a sofrer aquele dano causado pela fricção do calcanhar apesar de todo o abuso sofrido, confesso que me apeguei ao par da Asics e tenho dó de joga-lo fora. Nunca havia entendido como alguém poderia se apegar a algo que está nesse estado lastimável de conservação, mas agora é minha vez de me prender a um tênis que alaga quando chove e que já está no terceiro par de cadarços - por enquanto.

Na Avenida Paulista com a FAECV

Monday, February 13, 2012

Sobre alguns assuntos em um só post

Da Wikipedia:
"Na dermatologia, um calo é uma área dura de pele que se tornou grossa e rígida como uma resposta a repetidos contatos e pressões. (...) Já que o contato repetido é necessário para a existência do calo, o local mais comum para ocorrência é nas mãos e pés. Os calos geralmente não são nocivos, mas podem ser a fonte de outros problemas, como a infecção. (...) Músicos que tocam instrumentos de cordas desenvolvem calos nos seus dedos devido ao contato com as cordas, mas estes calos são muito desejáveis pelos músicos, já que eles ajudam a aliviar a dor da tensão das cordas. O mesmo acontece com fisiculturistas, que desenvolvem calos nas palmas de suas mãos, aliviando a pressão contra elas dos halteres."

Friday, February 10, 2012

Na pele

Demorou, mas saiu a tatuagem em homenagem à minha mãe. Ela faleceu no segundo dia de fevereiro de 2009 após quase uma década lutas: operações de retiradas de tumores, uso de bolsa de colostomia, quimioterapia, uma doença que lhe consumiu internamente passando por intestino grosso, um ovário, estômago e, enfim, o fígado, golpe que demorou mais de um ano para abate-la. Some-se a isso o primeiro ano da doença, quando minha avó materna portadora de Alzheimer exigia cuidados especiais. Isto tudo apenas para narrar sua última década de vida, poderia citar sua infância na fazenda, os obstáculos aos estudos, a enxaqueca, a vitória duma moça simples do sítio na pulsante São Paulo... enfim, são inúmeras batalhas e vitórias.

Tanta resiliência, determinação e vontade de viver são motivações e exemplos inspiradores, mas um pouco assustadores até. Sinto até uma certa impotência quando penso em tudo que ela e meu pai já enfrentaram e tudo o que construíram enquanto eu, com um caminho já parcialmente aberto pelos dois, não tenho a menor previsão de conquistar algum feito proporcional ao deles. Esta tatuagem, penso agora, pode ser usada como lembrete e "empurrão" da força quase invencível que carregava a dona Nair.

Enfim, sobre o trabalho: foi feito pelo tatuador Luís "Trash" Marchioni em apenas uma sessão de quatro horas e pouco. A imagem que tenho é de poucos minutos após o encerramento do desenho, feito no dia dez de janeiro. Como a pele estava recém-perfurada, ainda aparece avermelhada, mas após uma semana ela se tornou acinzentada e a ferida cicatrizou, ou seja, a pele está plenamente recuperada e a "tattoo" está com a cara que deveria. 

A ideia do anjo surgiu através DESTA CENA (sinto muito, só achei com áudio em inglês e sem legendas) do filme japonês The End of Evangelion, em que a jovem Asuka, abatida e sem auto-estima após uma desilusão, passa a sentir-se confiante e protegida pelo espírito de sua mãe. Esta epifania praticamente a traz de volta dum estado de inércia e faz com que esta desilusão citada acima seja apagada - descrição porca, eu sei, mas eu precisaria de outro post só para explicar a história de Evangelion e ainda não seria bem descrita. A partir daí criei essa fixação com a imagem dum anjo da guarda e dessa força impulsora que ele emanaria. Procurei alguns, mas a quantidade de anjos delicados é muito superior à de anjos imponentes - isso sem contar as anjas semi-nuas de seios à mostra.

O desenho escolhido foi encontrado ao acaso: apesar de eu ter uma cópia de A Divina Comédia com trabalhos deste artista, não pensei em procurar mais da obra do gravurista francês Gustave Doré, que ilustra o poema épico Paraíso Perdido, de John Milton. Este anjo é um figurante da história, apenas um guardião que deve procurar Lúcifer no Éden antes que ele consiga tentar Adão e Eva com o fruto proibido. Sua pose de descanso original foi alterada após a sugestão duma amiga quando eu lhe disse que o ser celeste também expressaria proteção e vigilância, então seria mais coerente que ele mantivesse sua cabeça erguida. Todo o tamanho, a inclusão do escudo e o ângulo da lança foram sugestões do tatuador, muito acertadas, por sinal. Hoje acho que meu outro ombro, "rabiscado" com uma bandeira paulista, está com pele em branco sobrando e que precisa ser mais preenchido. Mas, por enquanto, esse anjo já foi a cota de sangue, dor e dinheiro do semestre (pelo menos!).


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