Hoje de manhã, enquanto almoçava antes de sair para trabalhar, revi um
trecho de Troia, o épico estrelado por Brad Pitt e Eric Bana – intérpretes do
grego Aquiles e do troiano Heitor, respectivamente. A cena que tive tempo de
ver foi a do confronto entre os dois guerreiros.
Heitor é, sem pestanejar, o homem mais munido de virtudes e qualidades
em toda a guerra de Troia. É ótimo pai, bom marido, excelente filho e supremo
como lutador. Batalhou arduamente pela preservação de sua cidade e de seu povo,
embora a guerra fosse iniciada por uma molecagem de seu irmão mais novo. Lutava
pela honra sem buscar recompensa.
Aquiles, seu rival, não possuía laços tão fortes. Sabemos de sua mãe,
Tétis e de Pátroclo, seu primo nos filmes e grande amigo ou amante no livro, dependendo
da interpretação. Não era obediente a reis e não respondia a ninguém no campo
de batalha. Era ardiloso e oportunista; decidiu atravessar o mar Egeu para
lutar apenas depois de perceber a possibilidade de obter fama e glória no maior
embate de todos os tempos.
Pois bem, na cena que assisti enquanto eu almoçava, Aquiles foi às
muralhas troianas para desafiar seu rival. Heitor despede-se de seu pai Príamo,
de seu irmão Páris e de sua esposa Andrômaca antes de encontrar o grego para o
combate. Ofereceu tanta resistência quanto pôde e foi ofensivo enquanto era
possível, mas foi derrotado e teve seu corpo arrastado ao redor das muralhas de
sua cidade natal perante os olhos das pessoas que amava. A soma de todas as
virtudes do campeão troiano não serviu de absolutamente nada: não houve karma,
justiça do universo, intervenção divina ou nada semelhante que tornasse sua
espada mais rápida ou letal do que a de Aquiles.
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Quase três mil anos depois de Homero, é mais comum encontrar rapazes e
homens chamados Heitor do que batizados de Aquiles. Pesam contra o troiano a
derrota na luta e sua origem, já que os gregos influenciaram de forma consistente
a civilização ocidental com cultura, literatura, arquitetura, filosofia,
matemática, etc, etc. Apesar disso, seu nome se difundiu entre seus inimigos de
outrora. Em algum ponto de nosso passado rejeitamos, de alguma forma, o que
Aquiles representava ou em algum momento pusemos a bondade acima da agressividade?